Jornal Nova Geração

OPINIÃO

Adiando o inadiável

"O brasileiro prefere conviver com um manicômio tributário do que ter a coragem de enfrentar seus problemas”

É quase unanimidade que precisamos de uma reforma tributária. Temos um dos sistemas tributários mais complexos do mundo. Conforme o relatório Doing Business do Banco Mundial, o tempo para preparar, declarar e pagar impostos no Brasil é de 1501 horas por ano. Na América Latina esse número é de 317 horas e de 159 horas nos países da OCDE, quase 10 vezes menos do aqui. Além disso, temos um contencioso tributário judicializado de 73% do PIB, 260 vezes maior do que a OCDE. São mais de 300 mil novas normas tributárias desde 1988. A complexidade custa caro a todos.

Mas do problema reconhecido não avançamos para uma solução efetiva. Há décadas adiamos o inadiável. O brasileiro prefere conviver com um manicômio tributário do que ter a coragem de enfrentar seus problemas e fazer reformas necessárias. Tivemos sim péssimas ideias e propostas de reformas tributárias no passado. Não é o caso da PEC 45/2019, em especial o seu texto original, que copia exemplos bem sucedidos do resto do mundo. Não na teoria, que faz até com que a antiga CPMF pareça ser um bom tributo, mas na prática. Cerca de 90% dos países adotam o Imposto sobre Valor Adicionado.

Já escrevi aqui neste mesmo espaço sobre o tema no início do ano. E disse que a reforma encontraria resistência localizadas. É óbvio que uma reforma que venha pra corrigir distorções e reduzir desigualdades gerará impactos. Só que o custo de não o fazer é muitíssimo maior para a sociedade – mesmo que esse custo seja, muitas vezes, imperceptível no curto prazo. Além disso, o setor de serviços, teoricamente o mais impactado, permanece protegido em grande parte, pois cerca de 90% das empresas que prestam serviços ao consumidor final são MEIs ou optantes do Simples Nacional, que não sofrerão alterações conforme proposta.

É preciso que o debate tenha o devido cuidado no tratamento dos dados e nas projeções. Há muitos cálculos feitos sem o devido rigor, já que a complexidade do atual sistema torna difícil até saber exatamente o quanto cada setor de fato paga de impostos. Além disso, a nova proposta acaba com a cumulatividade, sendo que cada parte da cadeia poderá se creditar integralmente das despesas.

Num país avesso à reformas e com grupos de pressão organizados, cada dia que passa é oportunidade não para melhorar uma proposta bem desenhada, mas sim para destruí-la ou empurrá-la para o futuro – que, sabemos, nunca chega. Devemos sim nos manter atentos e vigilantes à questões fundamentais, como em evitar aumento da carga tributária total ou a criação de inúmeros regimes de exceção para setores que não precisam. Mas precisamos parar de adiar o inadiável e avançar. Um novo sistema tributário é parte fundamental para termos condições de crescer de forma mais sustentável.

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